1969. Na 3ªclasse éramos 4 rapazes e uma menina mas ela não nos dava confiança.
Pela reputação, a velha nem merecia que o seu nome fosse precedido de tia ou de "ti", era apenas a Albertina. Era velha, de idade ou com história suficiente para contar histórias das invasões francesas, vestia escuro como as outras velhas do lugar e não se lhe via família. Porque conhecia de toda a sua vida o chão que pisava, o facto de já pouco enxergar não a afetava. Porque dada a sua idade já tinha ouvido e dito tudo o que tinha a ouvir e dizer, a sua surdez grave não a incomodava. Andava completamente curvada, sendo-lhe difícil levantar a cabeça, sempre com um lenço queimado pelo tempo à volta da cabeça, uma saia das costas com a mesma textura e os seus afazeres reduziam-se a fazer sopa e a arranjar lenha. Terá sido, porventura, a última mulher da aldeia que não usava cuecas.
O Gaio garantia que vira claramente vista, no caminho de regresso a casa, com todo o à vontade e pormenor, a coisa da Albertina. Ela posava com ela exposta, recostada no monte dos carolos, guardados na parte coberta da eira e que serviam para acender o lume e limpar o cu. Ela gozava ali o sol de outubro, dos seus últimos outubros, quem sabe se no singular, e estava-se já cagando para o mundo quanto mais para que lhe vissem a crica!
Para que o Gaio não passasse mais uma vez por mentiroso, lá fomos os quatro, ávidos, confirmar ou descobrir aquilo que precisávamos e tínhamos direito a conhecer mais em detalhe. A Albertina, se não dormia era como se dormisse, não deu pela nossa cautelosa presença mas, embora estivesse no estado ou pose que o Gaio assegurara, da crica nada se lhe via. O guia, visto em maus lencóis, não acanha as mãos: pega num cavaco e com cuidado para não espantar o modelo, levanta a saia e, seguidamente, num gesto professoral aponta o sítio ao espanto dos companheiros. Apesar do sono da Albertina pairar entre este e outro mundo, a sensibilidade das peles fracas a um toque inadvertido, pregou-nos susto quando irrompeu a voz:
- Caralho do gato!
Recordada a história e a minha escola, chamem-me tarado, machista, labrego, ordinário, porco:
- Porra! Eu nunca tinha visto uma coisa daquelas!...
- Porra! Eu nunca tinha visto uma coisa daquelas!...
Ouso perguntar se gosta de mexilhão, Majestade......
ResponderEliminar:)
Lá no fundo
ResponderEliminarnem sempre se tem razão
Da crica ou do grelo, à descoberta do berço da vida, tudo faz parte do crescimento masculino... ou pelo menos era nos meus tempos...
ResponderEliminarCumps
Dona Maria, minha Majestade responde:
ResponderEliminarobviamente, que um incidente de infância não afeta o meu gosto por mexilhão ou berbigão. Uma vez, num soluço, engoli mesmo a concha de um crico e ainda conservo a impressão nas costelas com tantas palmadas nas costas que levei da minha mãe, para quem o termo simpático e carinhoso era mesmo crica.
Dois bejos abraçados e bons ares de costa e pesca de bivalves.
Afinal a dona da crica era a Albertina ou a Carolina. Da Carolina não me parece pois dessa me lembro bem e não se assemelha à da figura.
ResponderEliminarAmigo da onça! Carolina?!...
ResponderEliminarUma gargalhada pela manhã é a melhor terapia para nos aliviar de tantas preocupações. Obrigado.
ResponderEliminarEste comentário foi removido por um gestor do blogue.
ResponderEliminarÓ Pata Negra, eu, àquela hora, estava bêbado. Li qualquer coisa como 'levantar a saia' e prontos. Veio-me logo à lembrança aquela moda da 'saia da Carolina'. E eu saí. Saiu-me. Peço desculpa.
ResponderEliminarSaí, mas saí contrariado.
ResponderEliminarSobretudo muito bem contado! És um mestre no contar.
ResponderEliminarMexilhão é marisco?
crica? a velha exibia a crica? não sei, não.
ResponderEliminarmas a crica faz "cri-cri"!
aquilo era talvez uma "abébora"... passada.
saíste cá um "criqueiro", pá!