quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Diário de um Dia de Greve


Ergui-me à mesma hora dos outros dias! Não tomei banho nem fiz a barba para acrescentar gestos de protesto. Liguei o computador. Com os olhos enlameados da noite curta, fiz a espiral dos blogs costumeiros e, antes de sair dela, fechei-a ao centro. Confirmei com agrado que muitos deles estavam com a greve.

Ao pequeno-almoço, liguei a televisão: os números, sempre os números! Perguntei-me: 
- Se as adesões são sempre pouco significativas por que raio se anda sempre com a guerra dos serviços mínimos?!
E o arcebispo de Braga e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa:
"é um direito que assiste aos trabalhadores e é uma oportunidade que os portugueses têm de manifestar a sua insatisfação... um dia de greve é muito pouco. O povo português terá que se habituar a uma Democracia mais participada e mais responsável e manifestar-se não apenas nesta conjuntura mas também diante de determinadas leis que são prejudiciais para a sociedade... é hora de todos darem as mãos e do povo português não se contentar com o dia do voto. O povo terá que estar alerta e, porventura, ter uma participação mais crítica."
Decidi não ir ao café, ir-me-iam perguntar porque não fui trabalhar, porque é que era esta greve, eu iria num sorriso feito ao momento hesitar um pensamento – ainda perguntas?! – e sairia sem responder com uns bons dias de homem de boa educação!

Telefonei para o serviço. Abriu. Nem 50%!  Fui ver. Via-se bem: havia greve. Nos que furaram a greve havia vergonha e fingimento. Era um dia completamente diferente dos outros dias, era dia de greve.

Não é todos os dias nem por qualquer motivo que há uma Greve Geral – desde o 25 de Abril é a sexta e de certeza a maior.

Por tudo isto, almocei e bebi regaladamente. Não vi mais notícias e passei o resto da tarde a pensar. Que  força a desta gente que abdica de um dia do seu salário como forma de se exprimir num gesto tão simples! Que postura a daqueles que passam os dias a barafustar e não têm a pequeníssima coragem de sinalizar o seu descontentamento! Que descaramento o dos que dizem que dizem que agora é assim e ainda terá de ser pior! Que hipocrisia falar no direito à greve e nunca reconhecer o direito de a fazer! 
Pelas 16 horas bebi uma cerveja, voltei à blogosfera, bebi outra cerveja, voltei à blogosfera e estou aqui – já jantado claro - sem ter ligado à televisão, à rádio, borrifando-me para notícias da greve e de outras coisas, com a consciência do dever cumprido, consciente de ter contribuído para um futuro melhor, para uma data de registo e porque é meia-noite contente por ser Rei dos Leittões e ir colocar já este desajeitado texto algures num servidor como eu!

Não vai haver mais nenhuma greve como esta! Ninguém viveu este dia como eu!
Orgulhosamente: EU FIZ GREVE

ÚLTIMA HORA: "Governo diz que Portugal não parou"
- Pois não! Fez greve! Reclama um governo com visão!

7 comentários:

samuel disse...

Boa malha! Belo diário!

Abraço.

MARIA disse...

Sabe Majestade, quem aqui o segue, lendo com interesse a sua escrita de excepção e acompanhando as suas ideias e os ideiais que aqui expressa, orgulha-se deste Reino aonde o respectivo Monarca faz greve com esta arte!
Quando o Governo diz que o País não parou tem razão : o País fez greve - fez alguma coisa e o que fez não há-de ser em vão !

Um beijinho amigo

Maria

Anónimo disse...

Obrigado pelo texto. Senti-me orgulhosamente apoiado!
MRPP

Camolas disse...

Pois eu não fiquei em casa, pavoniei-me com todo o orgulho do mundo

antonio ganhão disse...

Passei pela greve e não te vi lá...

do Zambujal disse...

Este diário deveria afixado numa escola que eu cá sei, e fotocopiado para ser colocado em muitas outras. Merece a greve e a greve merece-o.

Grande abraço

José Lopes disse...

Eu estive nesta como noutras anteriores e enquanto formos tão mal governados(?) farei greve sempre que haja motivo para isso.
Duvido que os nossos pol´+iticos consigam compreender que estão a mais, mas eu acho que eles deviam ir dar uma volta para bem longe.
Cumps