quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Escola Prática de Artilharia

A casa mãe da artilharia portuguesa, reside num palácio do século XVII, construído para uma pernoita de troca de rainhas com Espanha e viria a ser a embrião da agora cidade de Vendas Novas. Foi lá, que ao longo de 17 longos meses, cumpri o Serviço Militar Obrigatório. Voltei lá há uns tempos, cumpridos muitos anos de “reserva”, para um encontro de antigos camaradas ou muito mais que isso de um núcleo de Amigos.
O tempo pode ter passado por nós mas não passou a forma de nos entendermos nem tão pouco o “tu cá tu lá” desses idos anos oitenta. O que me tocou mais foi a inércia dos espaços, as mesmas portas, as mesmas cores, o mesmo cheiro. De então para cá, do lado humano, foi tal a volta, que já não existem soldados de Portimão, de Bragança e de Leiria, já ninguém se apresenta a fim de receber o seu pré, já ninguém se encharca na aguardente dos não sei quantos bares. Os militares são sobretudo mulheres.
Todo o lado humano foi profundamente alterado e reduzido mas o quartel continua lá, à espera duma guerra que nunca mais acontece, a servir um país que simplesmente o ignora e que nem sequer sabe distinguir infantaria de artilharia.
Eram os tempos de revolta e incompreensão em que eu era contra o SMO e escrevi isto:

Aqueles soldados que ali vão marchando,
são artilheiros.
O símbolo da paz é, pomba!...
Os caçadores dizem: pombos!!...
Eu digo: irra que é burro!...
Brado às armas – por certo acordaste a noite de ontem
- distâncias não matam ideias!...
O comandante da unidade é um sucesso!...
Eu sou um fracasso!...Passo...
Passa. Raça. Pátria.
Passo a palavra e acerto o passo.

Aqui no aquémtejo, toda a tristeza é árida,
diferente dos olhos húmidos que conheço...

Daqueles soldados que ali vão marchando,
eu sou um deles.
Eles gostam tanto de mim
que me apertam
a mão
quando eu preciso.
Preciso sempre...
De Agosto nada quero, é vosso!

Eu e aqueles soldados que ali vão marchando
queremos ir embora.
Estamos inocentes.

Daqueles soldados que ali vão marchando,
eu sou um deles,
o mais igual aos outros, o mais subtil, o mais pacato.
E digo mais,
um homem sem esperança é um animal,
um homem sem sonho é um macaco
e eu sou um homem
que vai ali marchando
em Agosto de 1986, em Vendas Novas

12 comentários:

Zé Povinho disse...

Porque será que mesmo sendo contra o SMO muitos achamos que o tempo que cumprimos se desperdiçou no devaneios duma classe política que nunca soube respeitar o país?
Abraço do Zé

Olinda disse...

Muito giro,este poema!Vendas Novas nao ê muito inspiradora,mas neste caso,ouve outras fontes,concerteza.

luís Elvas Martins disse...

Agosto de 1963 em Vendas Novas. Inicio da perda de 44 meses do melhor tempo da minha juventude.Gostei do poema.

JFrade disse...

EPI (Mafra), RI5 (Leiria), RI16, (Évora) depois Moçambique - mais de 43 meses que perdi. Ganhei muitos Amigos entre aqueles com quem partilhei privações, perigos e paludismo. É costume reencontrarmo-nos pela primavera, sempre com emoção. Alguns já partiram.
JFrade

jrd disse...

Andei por outros lados, mas marchei pouco, excepto quando me deram a guia de marcha para sair. Nessa altura foi em passo de corrida.

Abraço

maceta disse...

em 74 na Calçada da Ajuda e etc...

abraço

Aristides Rodrigues disse...

E eu conheci Vendas Novas e entrei na EPA em Agosto de 81. Também era contra o SMO mas confesso que passei tempos de amizade e convívio inesquecíveis, tanto em Vendas Novas como depois em Leiria.
Enfim, só o facto de sermos tão novos nos faz ter saudade desse tempo.
Gostei do poema.

Carlos Sério disse...

Tambem eu por lá passei em 1966. Ena pá como sou velho.
Abraço

Anónimo disse...

O Sério não é sério: é um brincalhão. Eu também "assentei praça" em 1966 e não sou velho. Usado sim. E, ultimamente e principalmente, abusado...

Anónimo disse...

Ó Sério, tu não sabes o que é ser velho. Velho a sério é o tipo da história que te vou contar.

«Um homem levou o seu pai velhinho para um asilo de idosos.
Lá chegados, sentou o velhinho num sofá, na sala de espera, e foi à recepção falar com os médicos.
De repente, o velhinho começou a pender vagarosamente para a esquerda. Um médico passou por perto e disse:
- Deixe-me ajudá-lo.
O médico empilhou várias almofadas no lado esquerdo do velhinho para ajudá-lo a manter-se direito. O velhinho começou a pender vagarosamente para a direita. Um funcionário percebeu e empilhou mais umas quantas almofadas no lado direito dele. O velhinho começou a pender para frente.Então, passou por ali uma enfermeira que empilhou várias almofadas na frente dele.
A essa altura, o filho volta:
- E então, pai, este parece ser um lugar agradável, não?
O velhinho respondeu:
- Penso que sim, filho, mas eles não me deixam dar um peido!!



Kruzes Kanhoto disse...

Também fui uma vitima do SMO. Na EPT e por outros lados. Diz que agora andam por aí uns quantos a advogar o regresso do SMO...Só com uma moca nesses filhos da puta!

M A R I A disse...

Excelente texto, como sempre.