Estou triste... morreu o rato que me roía os livros. Deixou-me em testamento um par de orelhas. Agora ouço tudo, tão bem que nem um rato, que também ninguém me dá ouvidos. Dos segredos do vento ao ranger dos dentes do herói da guerra que reencontra a amada, sou todo ouvidos.
No vão de escada e no solar moram amigos mas o que eu digo não vale nada!
O rato morreu provavelmente por queda da estante. Suicídio?!
- Nunca! Ele era um rato muito agarrado à vida. Alimentava-se, vejam bem, dos meus livros!... Nunca lhe foram atirados sapatos ou vassoura! Vivia como os outros, em buracos, porque aí encontrava a sua liberdade!...
Se não foi suicídio, e um rato nunca morre de doença, resta-me pensar em homicídio! Algum filósofo ou químico alquimista, que se esconde para aí em alguma página virgem, estará por detrás deste caso. A imortalidade não resiste ao estômago de um simples roedor e vai daí, um simples empurrão da quinta prateleira... um rato cadáver com a cabeça sobre o nó duma tábua ...
Por isto, deixei de ler e com a herança que me foi deixada, tenho ouvido.
Um potencial assassino habita a minha estante e nada me trará de volta o rato que me roía os livros enquanto eu adormecia!...
Chamam-me criança, por eu chorar pequenas coisas e vestir de negro pequenas mortes. Mas ele não era um rato de romance de crianças, era real e manchou de sangue o soalho da minha sala de trabalho!...
Que viva eu ao menos e que ninguém me oiça! Por enquanto, vou roendo as minhas unhas...
Devidamente o Rato Cinzento foi...
No vão de escada e no solar moram amigos mas o que eu digo não vale nada!
O rato morreu provavelmente por queda da estante. Suicídio?!
- Nunca! Ele era um rato muito agarrado à vida. Alimentava-se, vejam bem, dos meus livros!... Nunca lhe foram atirados sapatos ou vassoura! Vivia como os outros, em buracos, porque aí encontrava a sua liberdade!...
Se não foi suicídio, e um rato nunca morre de doença, resta-me pensar em homicídio! Algum filósofo ou químico alquimista, que se esconde para aí em alguma página virgem, estará por detrás deste caso. A imortalidade não resiste ao estômago de um simples roedor e vai daí, um simples empurrão da quinta prateleira... um rato cadáver com a cabeça sobre o nó duma tábua ...
Por isto, deixei de ler e com a herança que me foi deixada, tenho ouvido.
Um potencial assassino habita a minha estante e nada me trará de volta o rato que me roía os livros enquanto eu adormecia!...
Chamam-me criança, por eu chorar pequenas coisas e vestir de negro pequenas mortes. Mas ele não era um rato de romance de crianças, era real e manchou de sangue o soalho da minha sala de trabalho!...
Que viva eu ao menos e que ninguém me oiça! Por enquanto, vou roendo as minhas unhas...
Devidamente o Rato Cinzento foi...
19 comentários:
Os meus pêsames sinceros por tão sentida perda.
R.I.P.
Nestes momentos não há palavras que possam aliviar a dor de quem perdeu um dos seus. Esse Rato Cinzento que se foi, coitado dele e de ti, só morrerá efectivamente quando dele nos esquecermos. Mas estou certo, que também ele "da lei da morte" se libertará.
Um abraço de sentidas condolências.
Zé
Deixa sempre dor o desaparecimento de alguém que vive perto de nós...
Paz à sua alma.
Um abraço de condolências
Compadre Alentejano
Pata Negra
É lindo este post. Ele é um hino às coisas simples e aos afectos. E às irreverências que não se moldam a um quotidiano redutor.
Por isso este blogue é uma marca. E eu sinto-o por dentro.
Abraço de consolo
Majestade,
Que texto lindo, bem escrito.
Constitui na verdade um acutilante desafio ao nosso espírito que está neste momento a cogitar : de que rato que roía os livros e não a rolha da garrafa do rei, estará o Rei a falar ...
Muito engraçado. Uma espécie de malabarismo cerebral absolutamente brilhante, fascinante!
"Chamam-me criança, por eu chorar pequenas coisas e vestir de negro pequenas mortes"
As nossas perdas têm o nosso tamanho e dimensão.Como poderia pois Vª Majestade chorar menos ...
Se o rato cinzento que caíu da estante era tão importante para si, certamente VªMajestade também o era igualmente para ele. Por isso, fique atento porque ele há-de nascer de novo por entre os seus livros e que com todo o gosto os aranhar.
Pelo menos enquanto Vª Majestade tiver essa alma de criança, a beleza dos verdadeiros afectos, o colorido da vida, o calor dos amigos, sempre retornarão à sua biblioteca para o cumprimentar no seu espacinho de liberdade.
E entretanto, não esteja triste.
Quer emprestadas as unhas para lhe aranhar os livros?
:-)
Um beijinho sempre amigo
Maria
Rei Pata (negra) lamento o sucedido e é preciso ser optimista. Aparecerá outro rato capaz de estoirar com os teus amados livros...
abraço
Olá Majestade.
Estou confuso! Se bem me lembro (e que saudades tenho do programa do Vitorino Nemésio) li em tempos no perfil de Sua Alteza Real que, em toda a vida, só havia lido 2 ou 3 livros. Daí a estranheza de uma estante com, pelo menos, 5 prateleiras. Depois vem o pormenor (grandessíssimo pormenor, por acaso) que, se bem lembro (Mau Tempo No Canal - romance fantástico) já é a segundo rato (o primeiro foi no tempo do João Rato, lembram-se) que se deixa suicidar ou então se homicida. Há-de haver uma explicação para tanta prateleira (3 livros?) e para o infortúnio dos ratos que habitam o Palácio Real. Embora confuso, percebendo pelo texto o desgosto que reina no Reino pelo triste e inesperado desenlace, quero manifestar a Sua Majestade, Sua Realíssima Família e à manada (será cáfila, será rebanho, será vara, será corja…) de ratos que habitam o Palácio, a minha mais profunda dor por tão grande e irreparável perda.
Alberto Cardoso
A minha solidariedade ao Rei ...
Uma grande perda, afinal alguém tinha que dar uso a esses livros todos!
...cremado?
Qualquer ser vivo que se extinga da face da Terra é uma perda irreparavel.
Servirá ao menos para um arrozinho ou como substituto da bolota?
Saudações do Marreta.
Ele foi!Quem sabe... alguém maliciosamente ocultou o seu espaço de liberdade e ele asfixiou?!
Mas... permanece viva a marca do seu passado.Parabéns pela herança. Escutar ajuda a viver e a escrever e a deixar marcas.
Oh, nosso Rei,
vai para aí um sentimentalismo que é coisa séria! Então, até o rato, que lhe dava cabo dos livros, fazia tão parte de um dia-a-dia, que era o teu, que chega a ser perceptível o desalento! Aquele desalento, que nos invade a todos sempre que algo se vai da nossa vida! Ou, o rato cinzento, simboliza uma parte obscura, menos clara ou por esclarecer, da razão do nosso rei? Mas, então, assim sendo, como poderia ter deixado uma mancha de sangue no soalho do aposento? Ainda se fosse uma mancha de água salgada...
Um abraço amigo e a minha admiração.
Magestade das pequenas coisas!
Pequenas para os grandes merdas que nos rodeiam porque para nós são as mais importantes.Brilhante!!
Beijokas de admiração
A arte de fazer parecerem simples as coisas realmente grandes...
Abraço.
Rei dos Leittões,
Simplesmente brilhante!
De uma coisa é certa o que te manchou o soalho já não é o rato, mas apenas, uma forma orgânica. O seu espírito já está na dimensão extrafísica a preparar a próxima vida.
Pode ser que tenha uma promoção e talvez, quiçá, ter a responsabilidade de administrar uma biblioteca pública.
Seria o culminar de um sonho.
Quem sabe...
Abraço,
Zorze
Um rato de biblioteca
Esse rasto não devia morrer
Majestade, dos pequenos nadas é que nascem os grandes homens. Com toda a certeza um novo rato surgirá na sua estante. Por cada rato morto dois novos ratos se levantarão.
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