quinta-feira, 9 de março de 2017

As aparições de Fátima no Relatório de Artur de Oliveira Santos

(continuação 1 - 2 - 3- 4 ) do Relatório do Administrador do Concelho de Ourém, Artur de Oliveira Santos, a propósito das aparições de Fátima, escrito em 1924.

Depois desta data, tendo eu deixado a Administração do Concelho, foi proibido e permitido, sucessivamente, o culto externo, mas as peregrinações ou romarias nunca mais tiveram a mesma importância de algumas anteriores. Posteriormente é que o bispo de Leiria, José Alves Correia da Silva, se resolveu a intervir. O primeiro acto foi levar Lúcia para fora de Fátima, a pretexto de a mandar educar, o que a própria família confirma, não se sabendo, porém, do seu paradeiro.
De vez em quando, escreve à mãe (ou alguém escreve por ela), dizendo estar bem, num colégio, e recomenda que ninguém duvide do milagre da Cova de Iria. Consta estar num convento em Espanha, o que é dito pelo vizinho Casimiro Rodrigues Esteves. Em Lisboa, na Rua dos Bacalhoeiros, Hospedaria dos Bicos, o proprietário desta, igualmente de nome Casimiro, um velho republicano, alguma coisa sabe sobre o assunto.

Para avaliar o critério do Bispo, basta ler, na provisão que vai junta a este relato e que foi publicada no jornal A Época, de Lisboa, nº1019, de 14 de Maio de 1922, a seguinte passagem: “Demais a mais, a pequena saiu da terra, nunca mais lá apareceu e, não obstante, o povo acorre ainda em maior número à Cova de Iria.” A sua intolerância é de tal ordem que, em 23 de Abril de 1923, mandou uma circular aos párocos da sua diocese, proibindo-lhes assistir a qualquer festividade religiosa onde comparecesse  a filarmónica dos Pousos (Leiria), pelo facto de aquela ter tomado parte numa festa liberal, julgo que comemorativa da Lei da Separação. O seu egoísmo e cupidez são grandes. A testemunhá-lo basta a caça feita à herança de D. Constança Teixeira Albuquerque, de Caldelas, freguesia da Caranguejeira (Leiria), uma pobre viúva que deixou os parentes sem recursos, para legar ao bispo uma fortuna que deve orçar por 800 contos.

O mesmo Bispo de Leiria foi quem veio dar alento à mistificação. Inteligente e astuto como é, procede com discrição e prudência. O dinheiro recebido da Cova de Iria (larga depressão de terreno como o nome indica), remetido, todos os dias 13, à consignação do bispo, é incalculável. Em Maio de 1923, o semanário republicano A Voz do Povo, de Leiria, que não foi desmentido pelos jornais católicos, noticiava que o dinheiro recolhido no dia 13 do referido mês somava 200 contos. Por informações que reputo fidedignas, a receita nos dias 12 e 13 do corrente mês de Outubro de 1924 foi de 120 contos. E há a notar que, encontrando-se a igreja paroquial em obras, nenhuma das importâncias recebidas na Cova de Iria foi entregue para a referida igreja. É tudo ensacado e levado a S. Ex.ª, para Leiria, no próprio dia 13 de cada mês.

Em Fevereiro de 1922, a pequena capela erguida na Cova de Iria foi destruída por um incêndio, atribuído aos liberais; mas o que é deveras significativo é que a imagem, que pouco antes do incêndio se encontrava exposta na capela, foi dali retirada para casa de Manuel Carreira, do lugar de Monte Redondo, que transita, todos os dias 13 de cada mês, para a Cova de Iria e vice-versa. Confessou o Manuel carreira ter visto, na noite do incêndio, luz na capela, o que não era costume, não se percebendo que, sendo ele o zelador do templo, se não importasse com o caso.

Antes de 13 de Maio de 1922, foi feita, pela imprensa monárquica e católica, uma intenssíssima propaganda para impressionar o espírito católico e conservador, tendo até o próprio Diário de Notícias, de 11 de Maio de 1922, publicado um artigo encimado por grossos caracteres, no qual se incitava o povo a visitar o local da aparição. Esse artigo era acompanhado de fotografias dos três videntes e da pequena capela e também da provisão do bispo de Leiria. Compareceram 25 a 30000 pessoas.

Em Outubro do mesmo ano, saiu o primeiro número do semanário Voz de Fátima, que foi distribuído gratuitamente e que actualmente deve ter uma tiragem de 20 000  exemplares, cuja impressão é paga por subscritores e que são profusamente distribuídos, não só em Portugal, como também no estrangeiro, fazendo a perniciosa propaganda de curas milagrosas e sobrenaturais – puras fantasias – para explorar o vulgo, sem origem na verdade, e que a superstição ampliou até o absurdo. Dirige o referido semanário o Dr. Manuel Marques dos Santos, de Leiria, tudo com a aprovação do bispo.

continuação ( 1- 2- 3- 4 ) 

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

só a verdade é revolucionária
hoje, como ontem, como sempre!
um documento notável que não conhecia

abraço