Nunca se vira noutra. O homem nunca fora daqueles que se tinha a si próprio como o melhor de todos, nunca tivera ambições de exercer poder, era incapaz de em alguma circunstância se dirigir a uma assembleia eleitoral e dizer "escolham-me a mim!".
Contudo, entenderam os pares que, naquela circunstância, ele era o melhor para derrubar, democraticamente, o poder que punha em perigo a democracia e elegeram-no cabeça de lista.
Nunca se vira noutra. O homem teve três acidentes em três dias, em três rotundas diferentes, o último dos quais com alguma gravidade, porque se desonrientou ao deparar-se com a sua própria imagem no outdoor.
Quando se teve de sujeitar às centenas de flashes do fotógrafo, aguentou. Quando soube do preço da campanha, aguentou. Quando lhe pareceu que a frase de campanha surpreendia tanto como o nome de qualquer telenovela, aguentou. Aguentaria tudo imbuído de espírito de missão. Nunca pensou é que o facto de se deparar com a sua própria imagem em cartaz, perturbasse o seu equilíbrio emocional a ponto de o atirar para a cama do hospital.
Segundo o psiquiatra hospitalar, não foi tanto o impacto do "efeito espelho" que o atormentou mas mais a circunstância de se ver lado a lado com os adversários que abomina, estivessem eles sós de meio corpo, aos pares de corpo inteiro, ao monte, em bando ou em matilha, sobre fundos verdes, azuis ou branco sujo, com frases ocas, vazias ou que nada dizem. Sentiu-se igual a eles, sentiu-se um deles e, mais grave ainda, deixou de reparar na moça de biquini que faz jus ao protetor solar melhor de todos.
Assim sendo, caso a força política em causa o queira manter como cabeça de cartaz, dadas as circunstâncias, terá de retirar todos os outdoors, colocar a juventude a colar cartazes nas paredes e a pintar murais, substituir as frases curtas por frases longas e contar apenas com o candidato para apresentar o projeto coletivo.
É claro que nestas circunstâncias é mais difícil ganhar mas também é verdade que não será tão fácil perder a face ou a cabeça, em sentido figurado ou num acidente.
3 comentários:
excelente, excelência.
subscrevia... se me visse nas circunstâncias!
Li o desabafo do Rei dos Leittões e assinalei a minha passagem clicando na "Boa patada" e segui. Mas alguma coisa indefinida e imprecisa me tem perturbado até que, agora, depois do bagaço pós jantar se fez luz, qual Arquimedes no banho: “Eureka!, Eureka!”. Sim, descobri que desabafo tinha muito de autobiográfico, o que me escapou na primeira leitura. Boa patada!
Do que tu te livraste. Sei lá de quantos incidentes acidentais...
E não sabes da sorte que tens de seres o 2º (ou mais abaixo) de uma lista de um colectivo que é o teu!
Forte abraço
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