terça-feira, 7 de setembro de 2021

Dias de festa

 Nós cá em casa gostamos muito de receber amigos de outras terras e dos fazer observar o valor do trabalho de ferro do candelabro da nossa sala de jantar, a vista única do nosso terraço ou as respostas pavlovianas do nosso cão, o Faro. É normal as visitas acabarem com serenas discussões sobre a questão afegã, a castidade ou a cantar o Cantar de Emigração ou então, simplesmente a abrir garrafas para apreciar o design das impressões das rolhas de cortiça. Não somos muito de os levar às voltas da vila medieval, da paisagem rural da Serra d' Aire ou da garganta funda do Nabão. 

Desta vez, o amigo, solteirão por opção, na conversa da religião, confessou com frouxo orgulho o facto de nunca ter ido a Fátima. Espanto nosso. Credo! Então?

- Não sou muito de religiões!

- E então?

Meia volta e lá fomos à volta. A arquitetura da nova basílica, a expressão dos crentes ajoelhados na capelinha, o poder do silêncio, as casas dos pastorinhos nos Valinhos, o negócio da bonecada, o altar húngaro, símbolo maior dos meandros políticos da mensagem e, no final, um "valeu a pena, gostei, se bem que não seja muito diferente do que já vi em televisão".

De novo na mesa do terraço e em nova conversa:

- Nunca fui à Festa do Avante! 

- Outra? Olha-me esta! Não acredito!

- Sabes, não quero nada com política!

Por regra nossa, quando nos deparamos com um adulto que nunca foi à Festa do Avante, tem de se analisar o caso. E  este, não seria por estar imerso no anticomunismo mais primário, por comodismo de sofá, por não gostar de boa música ou de outras artes, dos pratos portugueses ou de fobia de ter de recorrer a sanitários públicos com fila. Ainda mais não tinha sido daqueles que, há um ano atrás, fora na onda de estrear o seu perfil de facebook na coisa política, atacando com piadas pouco inteligentes a realização da festa com regras excecionais.

Milagre? Não diria tanto mas, três horas depois, estávamos os dois em plena quinta.

Espaço aqui, concerto acolá, copo daqui, petisco dali, cena bonita ali atrás, pessoas felizes ali à frente, por todo o lado gente, em toda a parte festa.

- Nunca pensei que fosse assim! Não percebo porque é que a televisão não mostra estas partes! Agora eu percebo aquela frase do "não há festa como esta". Pró ano cá estaremos! 

A alegria espelhada nas fotos do Egídio Santos não deverá incomodar ninguém, antes deverá fazer compreender a gratidão do meu amigo por eu o ter levado onde nunca tinha ido.



4 comentários:

Sérgio Ribeiro disse...

Sem comentário? Lá precisos não são... mas adjectivos não faltariam ao comentário.
Fica um forte abraço.

Rogério G.V. Pereira disse...

Olha, curioso
aconteceu-me o mesmo
levei a namorada de um amigo
a ir onde ela nunca tinha ido
e
não por acaso
ele o namorado
também entrou
onde nunca tinha entrado

Amanhã vou ligar
a saber quem mais terá gostado

Olinda disse...

Tenho a certeza que a Festa ter-lhe-à entranhado muito mais que Fátima.Também nunca lá fui e não me dá pena.

Justine disse...

É que não há mesmo!!