Coimbra, 29 de Setembro de 1974
Com o ar mais desalentado do mundo, disse-me:
- Temos a guerra civil.
- Deixá-la vir... - respondi. - Prefiro mil vezes morrer com medo do que viver com medo.
Coimbra, 29 de Setembro de 1975
Retorno maciço de portugueses do ultramar. Na aflição da fuga, até de barcos de pesca vieram muitos, a ponto de alguém dizer que fomos descobrir o mundo em caravelas e regressámos dele em traineiras. A fanfarronice de uns, a incapacidade de outros e a irresponsabilidade de todos deu este resultado: o fim sem grandeza de uma grande aventura. Metade de Portugal a ser remorso da outra metade. Os judeus da diáspora ansiavam por voltar a Canaan. Povo messiânico também, mas de sentido exógeno, para nós o regresso é o exílio. A nossa Terra Prometida estava fora de Portugal.
13 comentários:
descrito no rigor da realidade...
Caro João Rato,
Bem lembrado, o ano de 75. Eu cá estava, neste cantinho, ainda muito novo mas pró-PREC, a assistir àquele regresso atabalhoado dos nossos compatriotas. No entanto, devo dizer que pouco complacente com a sua decisão e o seu ideário político. Porque outros portugueses lá ficaram, sem medos, e singraram nas suas novas pátrias...
Sem ofensa. É apenas uma opinião.
Um abraço amigo
Cada um sabe de si e parece-me que nem sempre Deus sabe de todos... et pour cause...
Que bom que voltou a trazer-nos Torga.
Muito obrigada.
De todas as palavras que transcreveu, a nenhuma é possível reagir com indiferença.
Contudo há uma frase de Torga que nos toca particularmente entre tudo o que dele agora descreveu: preferir morrer com medo a viver com ele.
Talvez porque viver com medo, nem seja mesmo viver.
Talvez porque o primeiro dever de cada um de nós para connosco e com os outros seja viver, com toda a plenitude do que isso significa.
Neste blog onde se ri, se reflecte, se irmana a luta, hoje convocou-se o pensamento daquele que constrói e cria ...
Bem haja por isso.
Obrigada. Gostei muito.
Maria
Foram tempos difíceis que é bom recordar para que as memórias não se apaguem. Em tempos difíceis como os que atravessamos há quem fale no antes 25 de Abril como um período preferível em muitos aspectos. Quem o faz ou não sabe do que está a falar ou tem uma consciência muito negra do que veve ser a humanidade.
Martelo
um autêntico prego enfiado direitinho
Abraço
Savonarola
Concordo e ressalvo também o "sem ofensa", muitos são os que exibem as cicatrizes face ao tema. Tenho amigos cujas vivências nunca os deixaram compreender os acontecimentos. Mas tenho também um grande amigo que por lá continuou e continua - em Moçambique - sem querer cá vir morrer. É ele que me ajuda a organizar as ideias que teço sobre África.
Abraço
Quint
Mas é também bom que outros saibam de nós alguma coisa.
Abraço
Maria
merecido destaque da frase para os momentos que atravessamos. Voltaremos a encontrar-nos à volta do Miguel Torga.
Bjs
Silêncio Culpado
Nunca regressaremos ao passado mas devemos conhecê-lo. E se houve coisas boas no passado que era importante readquirir!... E se houve coisas tão más no passado que era importante lutarmos para que elas não se repitam!...
E no entanto, no pior de tudo, parece que estamos a regredir... olhe-se Sócrates e o que ele representa!
Uma descolonização inevitável e por isso mesmo feita à pressa. Os traumas ficaram para os que voltaram, e para os povos que julgaram que com a independência tudo ía ser melhor. As rupturas têm sempre efeitos, uns esperados , outros nem tanto, é a ordem natural da vida.
Por cá a maioria já refez as suas vidas, por lá ainda há feridas por curar, e caminho a percorrer no que respeita a qualidade de vida. O tempo não pára nem volta para trás, e o que importa mesmo é o que estamos a fazer para melhorar o futuro.
Cumps
Um homem com cem anos mas actualizadinho, e de que maneira.
Abraço do Corcunda.
Guardião
Uma desilusão o caminho de não desenvolvimento que tomaram as ex-colónias.
Por cá, ficou um pequeno país que, apesar de todas as crises, conseguiu integrar um milhão de cidadãos - é obra!
Corcunda´
é, portanto, um clássico!
Abraço
João:
A realidade de outrora, aplica-se bem no presente, não achas?
1 Abraço e mais uma vez obrigado pela nomeação do prémio "Visitante"!
watchdog
se eu não achasse nem teria sentido interesse em recordar, isto não nenhum blog de História!
Abraço
É curioso constatar que o ser humano evoluí, as sociedades evoluem, mas a política mantém-se estagnada... não acompanhou a evolução, as novas realidades!
Somente a corrupção na política é que evoluiu...
1 Abraço!
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