Esclarecimento para não julgarem que eu sou mentiroso - recebi da Antena 1 o seguinte e-mail:
"Caro João, Houve uma confusão na Antena 1 e trocaram as emissões d'A História Devida. A sua história passa no próximo Domingo, dia 15. Peço desculpa por esta confusão. Cumprimentos, e boas histórias,Inês Fonseca Santos."
Amanhã, Domingo, dia 8 de Março, 13 horas, Antena 1, A História Devida recebe a jornalista e copydesk Rita Pimenta para uma conversa que parte de uma das histórias que já faz parte da história do programa, passa pelas experiências de uma família numerosa e por alguns textos extraordinários da literatura infanto-juvenil e segue os relatos de uma jornalista que começou por ser ouvinte d'A História Devida e acabou por integrar a nossa equipa - tudo , claro, acompanhado pelas canções escolhidas pela Rita.
Depois entra uma história do Reino dos Leittões:
«História de um rádio», de João Rato . música: «Never so deep», Mikado Lab (álbum: Baligo).
Com apresentação de Inês Fonseca Santos e Miguel Guilherme, A História Devida baseia-se num conceito do escritor Paul Auster e pretende dar a conhecer as histórias de vida dos ouvintes da RDP.
A história do João Rato (a personagem que está por detrás da personagem Pata Negra) ligeiramente adulterada na sua versão radiofónica relativamente à original, é esta :
...
Tinha de regressar a Portugal, não suportava mais as saudades da mulher e dos dois pequeninos.
- Vou amanhã! Podes pagar o que me deves?
- Este rádio serve?
Além do fogão passámos também a ter rádio. A minha mãe era uma devota do aparelho. O rádio tem um aspecto bem francês e, na altura, o seu design dava um ar de modernidade à casa. A minha imaginação de pequenino, por vezes, punha-se a divagar sobre o que se passaria no seu interior oculto. Fartava-me de espreitar pela grelha de ventilação, parecia-me ver uns bonequitos em miniatura, insisti bastante mas nunca consegui autorização para abrir a caixa e desvendar os seus mistérios humanóides.
Era difícil a Guarda Republicana surpreender, ainda vinham a léguas a jusante, multando aqui e ali pelas duas razões de sempre - por tudo e por nada – e já um qualquer voluntário mensageiro trouxera à aldeia o “toque de esconder”. Nas tabernas, nos pátios, nas casas e em outros sítios haveria sempre alguma coisa para disfarçar ou para esconder.
- João, leva o rádio daqui, vai ao leirão de baixo e esconde-o no milheiral.
Não me recordo de haver tempo ou expressões para porquês, devo ter tido uma revelação súbita de consciência política. Quando o par de fardas armado passou à minha porta, a minha mãe fez de conta que mexia uns feijões que secavam ao sol em cima de uma manta, eu fiquei, firme e vertical, na berma do caminho, como quem assiste a um desfile militar, e era! Eles nem sequer dispensaram o olhar à minha criança.
Um rádio destes tinha de continuar, sempre vivo, no espólio da família. Há mais de quarenta anos que não se cala, os Parodiantes de Lisboa, o Badaró, o Simplesmente Maria, as canções de Abril, os noticiários do PREC e os tempos de Antena da AOC (Aliança Operária e Camponesa), o Rock em Stock, o Café Concerto, o Passageiro da Noite, a História Devida, um rádio que acompanha a história sem RAM, sem ROM, sem disco rígido, sem memória – é na ausência de memória e na sua dimensão temporal que reside a sua grandeza.
Só esta grandeza tem permitido que eu, de vez em quando, durma dentro do meu rádio afrancesado que me calhou em sortes. Costumo deitar-me no primeiro andar de amplificação, com a cabecinha radiouvinte recostada num condensador electrolítico de 15 microfarads e com os pés sobre uma resistência da ordem dos mega-ohms. Antes de me deitar desligo os terminais do altifalante e adormeço a ouvir o som directamente do transístor bipolar BC557.
Viva o meu rádio que muda de pilhas de seis em seis meses, que diz o que outros dizem, que toca todas as músicas, que é meu por herança, que não tem memória e que faz com que as pessoas pensem que quando eu falo dele é porque não tomei os comprimidos! Maluco eu? Maluco só se for pelo meu rádio!
- Este rádio serve?
Além do fogão passámos também a ter rádio. A minha mãe era uma devota do aparelho. O rádio tem um aspecto bem francês e, na altura, o seu design dava um ar de modernidade à casa. A minha imaginação de pequenino, por vezes, punha-se a divagar sobre o que se passaria no seu interior oculto. Fartava-me de espreitar pela grelha de ventilação, parecia-me ver uns bonequitos em miniatura, insisti bastante mas nunca consegui autorização para abrir a caixa e desvendar os seus mistérios humanóides.
Era difícil a Guarda Republicana surpreender, ainda vinham a léguas a jusante, multando aqui e ali pelas duas razões de sempre - por tudo e por nada – e já um qualquer voluntário mensageiro trouxera à aldeia o “toque de esconder”. Nas tabernas, nos pátios, nas casas e em outros sítios haveria sempre alguma coisa para disfarçar ou para esconder.
- João, leva o rádio daqui, vai ao leirão de baixo e esconde-o no milheiral.
Não me recordo de haver tempo ou expressões para porquês, devo ter tido uma revelação súbita de consciência política. Quando o par de fardas armado passou à minha porta, a minha mãe fez de conta que mexia uns feijões que secavam ao sol em cima de uma manta, eu fiquei, firme e vertical, na berma do caminho, como quem assiste a um desfile militar, e era! Eles nem sequer dispensaram o olhar à minha criança.
Um rádio destes tinha de continuar, sempre vivo, no espólio da família. Há mais de quarenta anos que não se cala, os Parodiantes de Lisboa, o Badaró, o Simplesmente Maria, as canções de Abril, os noticiários do PREC e os tempos de Antena da AOC (Aliança Operária e Camponesa), o Rock em Stock, o Café Concerto, o Passageiro da Noite, a História Devida, um rádio que acompanha a história sem RAM, sem ROM, sem disco rígido, sem memória – é na ausência de memória e na sua dimensão temporal que reside a sua grandeza.
Só esta grandeza tem permitido que eu, de vez em quando, durma dentro do meu rádio afrancesado que me calhou em sortes. Costumo deitar-me no primeiro andar de amplificação, com a cabecinha radiouvinte recostada num condensador electrolítico de 15 microfarads e com os pés sobre uma resistência da ordem dos mega-ohms. Antes de me deitar desligo os terminais do altifalante e adormeço a ouvir o som directamente do transístor bipolar BC557.
Viva o meu rádio que muda de pilhas de seis em seis meses, que diz o que outros dizem, que toca todas as músicas, que é meu por herança, que não tem memória e que faz com que as pessoas pensem que quando eu falo dele é porque não tomei os comprimidos! Maluco eu? Maluco só se for pelo meu rádio!
17 comentários:
Caro Rei,
Esse já é um rádio moderno, Não é dos de assar castanhas que faziam um calor estival, com os seus tríodoe e pêntodos e altas voltagens nas placas!
Como os tempos mudam as tecnologias! O que irá surgir nos próximos cinco anos? O que teremos de aprender a operar daqui a pouco?
Tudo é provisório e perecível. Como eternos ignorantes estamos sempre a tentar aprender a mexer nos novos aparelhos que complicam a rotina da vida!
Abraço
João Soares
Os amigos que acompanham este blog há algum tempo conhecem o seu rádio.
Tinha lembrança desta história, do seu rádio. É uma história deliciosa .
Muitos parabéns e muitas felicidades para todos.
Grande história! E só agora é que me avisas! Bem vou ter que fazer o download do som. Devias de facilitar aqui o link da página da Antena 1. Parabéns!
Os transistores bipolares sempre foram os gandas malucos meu!
Não te desfaças nunca de um fiel companheiro!
Abraço radiante.
Também tenho o meu rádio de estimação. É um Grundig, tem mais de 50 anos, OM, OL e SW, onde ouvia a Rádio Moscovo, Rádio Praga, Radio Portugal Livre, com interferências, claro.
Ainda funciona, como o dono...
Úm abraço
Compadre Alentejano
O nosso Rei é aquela máquina (rádio).
Eu tambem tenho radio antigo.Viajava atraves da Onda curta em procura de terras distantes.O meu pai ouvia o Radio Moscovo com um copo de água em cima do aparelho,tal como o Gonçalves Correia lhe ensinara,era para não ser detectado pela pide...
Outros tempos.
Beijokas
Viva o simples! Viva o que dura!
Viva o nosso rádio!
Se por acaso alguém tentou ouvir essas coisa na rádio, hoje dia 8, não ouviu nada! Os tipos deram barraca, não puseram no ar o programa anunciado.
Peço desculpa e aproveito para agradecer os comentários dos fiéis súbditos.
O Rei
Pata Negra
Meu amigo, gosto das Histórias Devidas, das tuas histórias que hoje não ouvi na rádio mas sobre as quais estou sempre atenta.
Também fui desses tempos dos rádios sem licença.
Abraço
Arrumei o rádio mas espero vir a ouvir a tal história, porque João Rato ou Pata Negra, que importa, ainda tem muito para contar, e os súbditos esperam.
Abraço do Zé
Peço desculpa por me intrometer mas a informação que a história devida seria transmitida às 13h00 só podia ser mentira porque toda a gente sabe que a essa hora é o noticiário. Tansos que vão atrás das tretas destes mentirosos de m****. Palermas!
Amigo Pata Negra
Depois de 2 meses privada de net, por ter mudado de residência, aqui estou de regresso, finalmente, e venho, numa primeira visita, deixar um abraço e a promessa de voltar para ler e comentar, como é devido.
Um abraço
Meg
a válvulas... ainda ouvi algumas vezes, sem outras soluções na época...
abraço
Olá Majestade.
Acabei de ouvir em «podcast» a última História Devida (que foram três). Ainda estou a digerir este novo formato pelo que não sei dizer se é ou não melhor que o anterior. Segundo percebi passa a ser semanal e a ter um entevistado em estúdio. É inegável que, assim, o programa melhorou de "estatuto" Duvido que tenha maior audiência. Como Sua Alteza Real em tempo oportuno preveniu, não foi desta que a sua história maluca sobre o rádio e o transístor bipolar BC qualquer coisa foi para o ar. Mas, como diz a sabedoria popular, o primeiro milho é para os pardais. As histórias deveras interessantes (embora malucas, repito) virão a seguir.
Cumprimentos para a Corte em geral e para Sua Alteza Real em particular do insignificante servo
Alberto Cardoso.
Pata Negra
Tenho pena mas domingo não posso. O meu neto faz 3 anos e eu vou de viagem.
Bolas!....
Abraço
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