sábado, 25 de agosto de 2012

Um pouco de lenha para a fogueira

Herdei um carvalho centenário que tive de cortar porque fazia sombra à aldeia. Este sábado lá fui eu prá terra ter com os meus três primos mestres na lide do moto-serra. Cortar um carvalho é tão violento e tão bárbaro como matar um porco. O moto-serra é a faca afiada, o tombo imponente, o derradeiro cuinho da matança e a extinção da sombra é como um curral que acabou de ficar vazio.
Passámos a manhã no desmancho do animal vegetal. O meu primo Manuel ganha 450 euros mensais, o meu primo Miguel está desempregado e o meu primo Arnaldo está emigrado e está de férias.

Para os sábios economistas da tv, os baixos salários são bons para a competitividade da economia, o desemprego é bom para flexibilizar a economia, a emigração é boa para os emigrantes mandarem as suas economias para Portugal e ter folga ao sábado tem graves implicações na economia nacional. Mas eu e os meus três primos estivemos a trabalhar, a produzir lenha e a produzir energia. Para compensar a energia dispensada com a força do nosso trabalho, tive de os compensar com um almoço de leitão já que o meu primo Manuel não me quis levar nada e tem sempre um porco a criar, o meu primo Miguel não quis nada e tem uma horta com tudo e o meu primo Arnaldo não precisa e diz que não manda para cá nem mais um tostão.

Passámos a tarde a jogar à sueca no bar da Associação, bebemos uns copos e, por causa da crise, a conversa foi parar à política. O meu primo operário deu sova no PSD e no Passos e diz que o PS fez coisas erradas mas que com eles não teria fechado o Centro de Saúde e que o Sócrates estava a começar a pôr os funcionários públicos no seu lugar e que isto assim vai dar merda. O meu primo sem emprego diz que o PS é que fez esta merda, que o Centro de Saúde só servia para as velhas porem a conversa em dia, que não há dinheiro, que o Sócrates é que se abotoou, que o Passos está a tirar os lugares aos funcionários públicos e que isto agora vai mudar. O meu primo que vive no estrangeiro, diz que são todos a mesma merda, que as enfermeiras são uma putas, que quer que se fodam os funcionários públicos e que mesmo que vivesse cá não votava.

E eu que sou funcionário público com pouca saúde, que sempre votei e nunca  votei no PS/D, que acho um escândalo existirem salários tão baixos que tanto produzem, desempregados num país com tantas coisas para fazer, gente ter de partir de onde nunca chegou, que gosto tanto dos meus primos, não tive coragem dos mandar para o carvalho: fui eu!: 

15 comentários:

Amigo dos animais disse...

Quer dizer que vocelência abateu um carvalho e, de caminho, abateu um súbdito. Por ventura um seu filho bastardo (nunca se sabe). Tá mal. Muito mal. Malíssimo! Abater o bácoro concordo, mas abater o carvalho é que tá mal. Malissimamente mal! Por muito grande que o carvalho fosse nunca faria sombra a uma aldeia inteirinha. E se fizesse, no verão, não era bom? Repito: tá mal. Malissimamente mal. Se fosse eu poupava o carvalho e matava dois leittões. Palavra de honra!
Amigo dos animais

São disse...

POis, que hei-de eu acrescentar ao que já foi dito?

Que me parece vir aí uma enorme confusão, porque vai ter que haver mudanças, pois a situação vai ficar cada vez mais insustentável? Então, digo, mas com uma resalva: não será o masno e domesticado povo porutguês e os seus politicos incompetentes e corruptos que começarão seja o que for.

Um abraço

Zé Marreta disse...

Então mas afinal acabaste por trazer o carvalho para casa?!
Espero que não tenhas lá deixado a moto-serra que, como instrumento tecnológico, faz parte da alavanca da nossa economia...

Saudações!

M A R I A disse...

Os meus parabéns pela excelência da escrita, da fantástica construção de ideias aonde por entre todas as coisas que diz mas que não quer dizer, há umas grandes verdades colocadas pelas bocas dos seus primos no texto : é assim mesmo que o nosso Povo sente os efeitos do rescaldo da Governação de Sócrates e os efeitos da actual governação. A própria queda é uma imagem que inserida nesse contexto, conta do quanto por vezes nos vemos na necessidade de explicar aos filhos, a humilhação das quedas das bolsas, dos mercados, dos ordenados, etc, etc.

Assim partindo de uma aparente nota hunorística deixa um sério recado : já há Portugueses a dizer Sócrates volta que estás perdoado ...

E isso é grave, porque quem bem fazia cortar carvalho era ele, só para se ocupar agora que está sem trabalho público.

Um beijinho amigo

Maria

Compadre Alentejano disse...

Que o próximo inverno seja frio e chuvoso para que a lenha do carvalho seja 100% útil.
Abraço
Compadre Alentejano

salvoconduto disse...

Ainda te vais tamar com essa coisa do caralho, desde quando se pode abater um desse taanho, tu nem te apercebeste que os que eles tinham era inveja do teu carvalho, a dar sobra para a aldeia toda já seria monumento nacional, é o que eu te digo arranjaste leha para te queimar,ainda vais ter o IGESPAR à perna. Pimos como esses dispenso eu bem, irra.

cid simoes disse...

Um flash perfeito.

Zé Miguel disse...

Foi logo o carvalho onde eu dormia a sesta. Que se lixe o Sócrates e o Passos. Eles que vão para outro carvalho.

maceta disse...

têm razão , são mais ou menos a mesma merda, emboramente a que está em vigor seja uma merda maior.

abraço

O atento Crisântemo Ciclomotor disse...

Afinal as minhas palavras e ensinamentos surtiram efeito. De facto é com prazer que noto que mais ninguém se atreveu a rabiscar umas palermices e tentar convencer os entendidos que aquilo era poesia. Sempre houve liberdade poética mas há duas regras que têm que ser observadas: a métrica e a rima. Sem estas duas condições não há poesia. Mas o disparate é tão grande que há coisas que li que também não são prosa! É incrivel como há pessoas que conseguem garatujar umas palavras que nem são prosa nem poesia. Afinal o protagonista de “Um Fidalgo Aprendiz” de D. Francisco Manuel de Melo estava certo quando pedia, pagando o necessário, que lhe escrevessem uma carta de amor à sua amada mas que não fosse em verso nem em prosa. O riso de escárnio que isso motivou! O homem tinha razão mas teve-a antes do tempo. Se fosse hoje pespegavam-lhe com um texto que nem é carne nem peixe e roubalham-lhe uns euros.
Crisântemo Ciclomotor (Primo da Rosa Mota)

do Zambujal disse...

Aleluia!
Por ca(u)sa do car(v)alho confirmei a excelente nova que ninguém quis o teu blog. Nem dado (e arregaçado). Assim terás de continuar a publicar estes excelentes retratos da vida e e da opinião púb(l)ica!
Quem tem primos desses tem uma amostra muito válida do estado das massas...
E quem é que ganhou a suecada?

Um abraço (apesar do derrube do carvalho)

José Lopes disse...

Um Portugal bem retratado na figura dos primos...
Cumps

O Puma disse...

Estimado amigo

Ainda há carvalhos compreensivos

mas também os que resistem

samuel disse...

Grande texto!

Abraço.

Anónimo disse...

Carvalhos me mordam, grande cena esta!!! Fizeste-me lembrar a àrvore dos patafurdios (quem não se lembra??). Neste caso a àrvore dos patifes, HOMENS do Governo, que descaradamente sustentam-se da mesma seiva, a DO POVO. Não podemos apenas cortar o carvalho, mas sim arrancá-lo pela raiz, para que não restam quaquer hipotese de rebentos.