quinta-feira, 7 de maio de 2015

Sete olhos inchados


A malta estava naquela idade do "não é nem deixa de ser" em que o maior divertimento da festa era apanhar as canas dos foguetes e em que, ao mesmo tempo,  já se podia desempenhar a tarefa de andar a colar, a pedido do senhor prior, os cartazes do programa da Festa da Nossa Senhora do Rosário lá da terra.
A nossa energia e habilidade deve ter sido reconhecida por um filho de gente bem parecida lá da terra, estudante em Lisboa, que nos deu uns trocos para que colássemos pelas paredes lá da terra, uns cartazes dum movimento cuja sigla terminava em "P"  e cujo símbolo tinha uma foice e julgo que um martelo.

E nós, já noite feita como nos tinha sido recomendado, cumprimos a missão com o mesmo entusiasmo e com a mesma inocência com que tínhamos colado os cartazes da Festa da Nossa Senhora do Rosário, apenas com a pequeníssima diferença de que agora não era Deus que nos pagava mas um rapaz filho de gente bem parecida.
Durante o caminho de regresso do trabalho ficámos surpreendidos porque todos os cartazes tinham voado - vento não estava e era boa a cola, de modo que ali teria havido mão do diabo.

No noite seguinte o gadelhudo mal parecido, filho de gente bem parecida, veio ter connosco, espetou-nos uma carga de porrada e espetou-nos na mão mais uma carga de cartazes para que desta, lhe fizéssemos a encomenda já paga e que se não a fizéssemos levávamos mais.

E quando íamos a meio da penitência, surge-nos um outro filho de gente bem parecida lá da terra, reconhecido militante dum partido cuja sigla terminava em "D" e espeta-nos uma carga de porrada.

Não sei se este episódio foi determinante nas minhas opções políticas, sei que lá na terra, sou reconhecido por elas.

Sei também que hoje fui à terra e, ao entrar no café, vejo numa mesa cheia de imperiais e cascas de camarão, dois velhos bem parecidos. Reconheço-lhes, pela pinta, a simpatia por um partido cuja sigla termina em "D" e reconheço-os de duas cargas de porrada. Com eles está um terceiro indivíduo que conheço como sendo o presidente da junta que é dum partido cuja sigla começa por "P" e termina em "S" sem nenhuma outra letra no meio.

Dirijo-me ao balcão para um tinto e uns tremoços. Vejo-os a rirem-se e a olharem para mim. Voltam e rir-se e a olhar, trocam palavras, olham e riem-se, voltam a olhar e a rir, inchados! Pago a despesa e, ao sair, juro que sem querer, dou um valente encontrão na mesa dos figurões. Vira-se a loiça toda e sujam-se as calças finas dos figurões. Peço-lhes desculpa.
Tenho um olho inchado?! Mas no total são sete olhos inchados com vitória a favor do meu partido.
- Fiz um figurão!...

6 comentários:

Anónimo disse...

Bonita história.

O Puma disse...

Não te partas
fazes falta inteiro

O Puma disse...

Não te partas
fazes falta inteiro

Manuel Veiga disse...

"amores" antigos não cansam...

se o exemplo pega, ainda temos por aí uma "bernarda" - um dia destes!...

Zambujal disse...

Levar porrada sempre também cansa, que se riam de nós exaspera (exaspera aí que já te digo!)... e ganhar 6 a 1 é uma cabazada e o nosso olho inc hado inté brilha!
Chega-lhes, e se preciares de ajuda diz.
Um abração

José Lopes disse...

Já todos levámos porrada, mas isso não muda convicções, amenos que seja, fracas...
Cumps