sexta-feira, 1 de março de 2019

Um dia de Natal no Carnaval

Há uns anos, preparava com uns amigos uma peça de Natal para o Natal da coletividade. A três dias da estreia as coisas estavam tão mal!... os atores não sabiam o texto, os cenários não se desenrolavam, as músicas enrolavam-se, os projetores fundiam-se, o desastre anunciava-se, de modo que decidimos cancelar o espetáculo.

Custava-nos desperdiçar o trabalho entretanto realizado, adiar para o próximo ano seria demais, pelo que decidimos fazer uns ajustes ao guião para que a história encaixasse no Carnaval e, assim mesmo, ela foi a cena, no domingo gordo, com o nome "Um dia de Natal no Carnaval".

Foi um sucesso. Natal e Carnaval rimam de facto. Desde então não consigo separar as duas festividades e janeiro é quase como se não existisse. Também o Fabrício me ajudou a esta combinação.

O Fabrício é uma daquelas personagens únicas que todas as pequenas cidades de província têm, acarinham e faz parte do meio. É portador de um qualquer distúrbio mental que lhe dificulta o ganha-pão. Jovem ainda, assume-se atleta e corre as redondezas em treino permanente. Entra na barbearia, no talho, no supermercado, na repartição, contando as proezas das provas de atletismo em que participa, e sempre a correr, como se os seus afazeres não lhe deixassem tempo para parar muito tempo em algum lado.

Por vezes permanece imóvel em lugares frequentados, põe uma caixa de sapatos à sua frente e espera que caiam algumas moedas dos peões. Fica estático, numa pose que assume a sua condição, e essa autenticidade retira-lhe o grau menor de mendigo e confere ao seu gesto a dignidade de um trabalho a 
que tem direito. Julgo que consegue, por isso, resultados suficientes para o sustento.

Naquele Carnaval, o Fabrício fez uma bem dele! Dispenso debruçar-me sobre as suas razões e convido cada um a cogitar nelas: o Fabrício andou pelas ruas vestido de Pai Natal!


Este texto, tal como esta foto, homenageiam o Fabrício. 
O Fabrício é o do meio.

2 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...

De Fabrício e de louco
todos temos um pouco
e, não é verdade, afinal
se todos os dias é Natal
ninguém pode levar a mal

zambujal disse...

QUE COISAS QUE TU, MAJESTADE, RE/ACORDAS...
'INDA OUTRO DIA ME LEMBREI DESTE LIVRO A PROPÓSITO DE UMA SESSÃO NO MUSEU EM QUE O MOTIVO DA ENCHENTE FOI O SR. MANUEL CARTUCHO! E LEMBREI-ME DO FABRÍCIO! QUE SERÁ (SIDO) FEITO DELE?
UM ABRAÇO PARA VOSSA MERCÊ, PARA O OUTRO DA FOTO E PARA
O ZAMBUJAL