sábado, 14 de novembro de 2020

A "comparação" é o verbo do povo - Ricardo Araújo Pereira


Tão grave como o PSD fazer um acordo com o Chega é Ricardo Araújo Pereira ter no seu  Governo Sombra o João Miguel Tavares.

Ricardo Araújo Pereira é uma espécie de Cristiano Ronaldo do humor. Admiramos de tal forma o que eles fazem e os estatutos que daí lhes advêm, respeitamos de tal modo a sua fama e a sua fortuna que somos incapazes de os pôr em causa, antes os bajulamos e temos como intocáveis. Quando muito, podem existir alguns que lhes dedicam aquela consideração que tantas vezes ouvimos: "José Saramago é um grande escritor mas não aprecio a maneira como escreve".

Ricardo Araújo Pereira pode ridicularizar qualquer personalidade de proa, fazer-nos rir dos figurões nacionais, troçar até mais não do mais alto magistrado da nação. Todos dão o "e oito tostões" para se sentarem à sua frente, com o convencimento, é certo, de que se vão sair como porreiros e que vai ser fácil a entrevista porque já lhe foram antecipadamente facultadas as questões. E é sempre fácil porque o humorista quer apenas ser um tipo engraçado e dar-se bem com toda a gente - é assim que ganha a vida.

É assim que Ricardo Araújo Pereira vai timidamente à Festa do Avante ao mesmo tempo que não recusará uma galhofa com o Chicão, um beijo na mão às Mortáguas, um abraço ao Rio, um jantar com o Costa ou uma condecoração do Balola da República.

Reconheça-se que já deu a entender que com Ventura nem uns "bons dias". Fez mais contra o Chega nos dez minutos que dedicou à sua convenção no seu programa dominical, que milhentas provas das mentiras e contradições que ao Chega dão o sucesso, que horas e horas de comentários de TV sobre novos populismos, que páginas e páginas de intelectuais democratas sobre os perigos que a democracia corre.

Mas Ricardo Araújo Pereira está num palco perigoso. Contracenar com um cabeça rapada de óculos azuis, ampliar o alcance do cronismo de direita que o quotidiano do Público concede ao seu menino, tentar fazer graça com um porteiro do fascismo, não tem graça nenhuma e talvez lhe venha a sair tão caro como o caso dos Açores ao Rui Rio.

Ainda que em diferentes papéis, João Miguel Tavares é tão perigoso como André Ventura. Ricardo Araújo Pereira estará a pecar mais do que Rui Rio, partindo do princípio que o seu humor inteligente não é assim tão ingénuo ou inocente.

3 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...

Nestas coisas do humor e da política
há sempre imensas hipóteses de
ser preso, por ter cão
ser preso, por não ter cão
ser preso, por ser cão

Donde,
o Ricardo Araújo Pereira
e devia ser preso, já
pois até ele ladra, ladra, ladra
mas a caravana passa
animada, à brava

Justine disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Justine disse...

Acho que tens toda a razão (para além do facto do texto estar muito bem escrito!)
Bom domingo