Eu era ainda muito novo e ficou-me dessa data a circunstância do nascimento dum irmão. A Ti Luísa, parteira lá da aldeia, perdera com a idade o necessário desembaraço da sua arte e, vai daí, o meu pai pediu emprestado um Fiat 600 - ou Fiat Uno, não vem ao caso - para a luz se fazer na maternidade da cidade. Só que à entrada da ponte de Santa Clara – nessa altura ainda não havia a Vasco da Gama – uma barricada do Movimento das Forças Armadas - ou de outras forças não vem ao caso - travou a marcha urgente e impediu a partida porque o proprietário do veículo tinha a bagageira equipada com uma catana belicosa. Vieram à minha mãe as dores mais fortes, julgaram que era manha e, se não chamam o alferes, o rapaz teria nascido ali no meio da operação revolucionária.
É por esta história de família que guardo o testemunho de que alguma coisa houve naquele dia.
Volvidos estes anos estou já um pouco cansado, como aliás já devem ter reparado numa ideia ou outra deste texto, mas mantenho esta vontade acesa de recordar tempos revolucionários para deixar aos novos a esperança de novas revoluções que hão-de fazer girar a história.
- Se bem me lembro o 28 de Setembro foi há 36 anos e nessa data nasceu um irmão meu. Não sei se o mais novo se o mais velho de cinco que somos. Gaita, agora é que foi! Não sei a qual deles eu devo telefonar para dar os parabéns…36 anos…eu tenho… hei-de lá chegar, não vou cometer a indelicadeza de me enganar!...
6 comentários:
Olá Majestade.
Santa Clara, Vasco da Gama, que confusão aí vai...
Tal qual o 28 de Setembro que ninguém entendeu. Tentativa de contra-revolução da «maioria silenciosa» de direita, fiéis de Spínola? Qual maioria se ninguém saiu à rua. Pretexto para as forças de esquerda, afectas ao PC e a Vasco Gonçalves, darem um impulso à revolução que caíra num impasse? Talvez porque é um facto que o Spínola, dois dias depois, demitiu-se de Presidente da República. Luta entre facções, moderadas e revolucionárias dentro do MFA? Isso de certeza.
P.S_1. Seria a ponte de D. Luís?
Não! Já sei: era a pont´a pé.
Os meus respeitos para Sua Alteza Real.
Alberto Cardoso, um servo às Suas ordens.
P.S_2. Espero, Majestade, que não repita a graça de ´censurar`, quero dizer não publicar, este comentário. O lápis azul foi-se com o 25 de Abril e com o 28 de Setembro!
Em cada texto me surpreendes, em cada texto encontro prazer e proveito. Não pode ser!, hás-de ter no baú uma porcaria qualquer para eu te encontrar defeito na escrita...
Muito a sério, este é um excelente texto. Talvez sobretudo para quem não nasceu a 28 de Setembro, mas - no seu segundo nascimento - uns meses antes, a 25 de Abril, quando lhe abriram as portas da prisão de Caxias... pelo lado de fora!
Obrigado e um grande abraço
Recordar é bom, mas recorda-me sempre que estou velho. Vou sair agora para a baixa, porque ainda acredito que o mundo pode ser melhor, mais justo!
Abraço do Zé
Das duas uma: ou faz bem as contas, ou terá que telefonar a todos os irmãos ;)
Estava eu e mais um punhado deles fardados nesse dia e à procura do 28 de Setembro...ali para os lados de Belem caminhámos, procurámos e ficámos com a ideia vaga de que houve 28 de Setembro, aliás, como em todos os anos seguintes... comentámos na ocasião que fomos embarretados.
abraço
É outro texto admirável sob vários aspectos.
Há sempre uma nota de humor inteligente sobre um tema sério e até perturbador.
Quanto ao mano, estou certa que resolveu o problema, mas é de certeza o que mais abomina fardas :)
Um beijinho amigo
Maria
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