Correram o caminho de regresso, dispostos a só deixar a estrada quando encontrada vieira ou povoação, já que a costa marítima recortada e a mania das bússolas mentais lhe poderiam trazer outros dissabores do género.
- Quem navega no oceano perde-se se não olhar as estrelas; quem percorre as serranias perde-se se não vir sol mas quem caminha junto ao mar nunca se perde, dizias.
- Dizes bem, dizia mas agora já não digo. Esta mania de enrolar frases bonitas e de tentar erguê-las procurando-lhes um sentido, pode desmoronar-se numa triste mentira. Junto ao mar não se caminha, passeia-se!
- Mais uma mentira!...
Desorientados e cansados, com conversas destas à mistura, acabaram por se cruzar com um carro ao qual fizeram alta, tendo sido informados da proximidade duma aldeia e do local onde reencontrariam o rumo das vieiras.
Já encaminhados cruzaram-se com ciclistas conhecidos de Negreira e Oliveiroa, caminhando no sentido inverso, que os alertaram para o facto de irem encontrar um rio, “el Castro” que, para transpor, exigiria procedimentos à medida de cada um.
Tinha para aí uma dúzia de metros de largura e mais de um de altura de caudal. Existiam umas pedras paralelepípedas para pousar os pés, espaçadas no leito de modo a permitir a travessia, de Pé Ante Pé, com água acima do artelho e abaixo do joelho. Mas foi Pé de Atleta que tomou comando.
- Os tipos assustaram-nos sem razões para isso!
- Mas eles tinham o problema das bicicletas!
Mas, à segunda pedra, ainda Marie estava em terra, sentada em relva de olhos fixos nos pés do seu rapaz, o lodo escorregadio da rocha limada pelas águas, atira com todos os pés e seus haveres para água.
Uma grande gargalhada de Marie enfurece o sinistrado. Regressa à margem de partida, fora de si e, só quando sente terra enxuta, se rende ao riso e começa a sacudir-se à volta da sentada.
- Nem sequer ousaste erguer-te em meu socorro!
- Para quê? Ainda perdia a graça!
- E agora?
- Tenta outra vez! Quando chegares à outra margem, partirei eu!
Nem pensou que, com tudo molhado, mais valia ir de pés nas pedras roladas do leito e de mochila à cabeça. Foi Pé Ante Pé, demoradamente testando a aderência a cada pedra, até chegar a terra firme para se voltar para trás vitorioso:
- Cheguei!
- Molhado!
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Todas as segundas feiras.
Pode(s) ler toda a história em O Caminho do Fim da Terra
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7 comentários:
À prosa habitual juntas agora uns diálogos muito bem construídos. Meu caro a tua escrita surpreende-nos e fascina-nos a cada novo episódio.
Dá-lhe pés...
Ser-se afoito nem sempre resulta bem, mas não me parece que ele vá desistir, ainda mais com a Marie por perto.
Abraço do Zé
É verdade,Majestade, texto tão bonito, tão bem construído. Até caí ao rio do espanto e da admiração. Muito lindo , este texto!
Um beijinho amigo
Maria
Hoje foi caminhada sem malandrice, tambem não pode ser a toda a hora.
abraço
Este texto fez-me lembrar uma vez que caí à água, numa ribeira da minha terra. Nunca mais a tentei atravessar a pé, claro.
Abraço
Compadre Alentejano
Bom dia. Na divulgação do meu blog vou descobrindo pelo caminho outros igualmente interessantes. Parabéns. Aproveito para convidar a ver o meu espaço sobre pintura, aguarela e desenho. Se poder divulgar pelos seus amigos agradeço.
Cumprimentos
Francisco Santos
Estou a pôr a leitura em dia, andava um pouco atrasada...
Bonita fotografia, as águas límpidas... Mas as pedras são escorregadias, claro ;)
Agora, vou lá acima, a ver se a Maria também consegue fazer a travessia.
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