segunda-feira, 11 de abril de 2011

Trinta e Três farinha e Sete Pés


Depois da primeira manhã, na primeira tarde do primeiro dia, depois do almoço improvisado com "frutos da horta" que a esposa de Xésus Agrelo veio trazer, acharam por bem ir à mercearia da aldeia abastecer-se de mantimentos para a casa.

Na manhã do segundo dia, por proposta de Xésus Agrelo, Pé de Meia e Pé de Atleta foram com ele para a pesca de anzol junto à costa. Depois da segunda manhã, na tarde do segundo dia, Pé Descalço e Pé de Vento, foram com Marie para a praia, tomaram banho no mar revolto e frio e enrolaram-se na areia fina.



No terceiro dia, Pé Ante Pé, passou o dia com Xésus Agrelo a ajudá-lo nas coisas da lavoura. No quarto dia, Água Pé deu a volta com Xésus Agrelo pela aldeia e ficou a conhecer e a ser conhecido pelos naturais. No quinto dia, Pé Chato já achava os dias sempre iguais. Nos dias seguintes, dos três meses seguintes, repetiu-se o convívio, a pesca, a lavoura, a praia, o campo e amor que a maior parte das vezes se fazia no banco corrido da varanda com vista para o mar. Os caminheiros amantes pensavam, cada um para si, no Fim daquele estado de enamoramento mas nenhum deles ousava tocar no assunto ou falar de Finisterra. Foram várias vezes a Cee, o burgo município, umas vezes à boleia de Xésus Agrelo, outras de autocarro e até a pé, tratar de compras e outros assuntos mas pisar Finisterra nunca esteve em cima da mesa, seria o Fim. Xésus Agrelo foi-se apercebendo dessa não-vontade e  interrogou-os acerca do impedimento, tendo aceitado, com galega inteligência as suas explicações.

Sete Pés, porque não tinha família nem raízes e porque estava estava a realizar o seu projecto de vida de caminhar mundo além, poderia estar ali a vida inteira que ninguém daria pela sua falta. 
Marie, por outro lado, com a sua idade e a sua vida, já tinha contribuído para certas mudanças, dum mundo que muda sem reconhecer o contributo das marias que o mudam. E foi por ter observado  o mundo mudado que ajudou a mudar, que se sentia ali bem, num outro mundo. O seu mundo novo que se consumia à velocidade de uma vela de cera ardendo!

Quando ia a Cee fazia longos telefonemas para o marido e inventara uma explicação para o adiamento do seu regresso a França: da sua competência de bombeira reformada, com conhecimentos na área do socorrismo, surgiu-lhe a oportunidade de fazer uma temporada de voluntariado numa organização de apoio aos peregrinos do Caminho. - Mentira?!

- Eu sou sete peregrinos necessitados de especial apoio e uma mentira pode valer a pena se a razão não for pequena!
Consolava-a Sete Pés com as suas razões “pessoanas” que, frequentemente, serviam também para brincar com ela com a desmultiplicação de pés. Marie perguntava sucessivamente:

- Com que pé estou a falar?... Que pé está em cima de mim?... Que pé me está a chamar?... Ai! Ai! Todos não que me confundem!... Ai! Ai! Todos não que me derretem!..
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Todas as segundas feiras.
Pode(s) ler toda a história em O Caminho do Fim da Terra.

6 comentários:

Anónimo disse...

Um romance cheio de pes para andar! Uma Marie corajosa sem duvida, que luta pela sua felicidade...ainda que nas historias seja tudo mais facil, em que nao se magoa na realidade ninguem, exactamente por nao passar disso mesmo: uma historia!

Entretanto, com tantos pés à mistura... ate podia pôr os pes pelas maos e sair um fiasco... mas antes p'lo contrario, consegue com uma facilidade incrivel dar "vida" a cada um e a todos eles!
PARABÉNS!

MARIA disse...

Uma espécie de oasis no mundo real agreste é como esse cantinho, também a sua escrita, Majestade!
É um encanto lê-lo, muito obrigado.Vale a essa Marie antes de mais ser Bombeira. Uma farda impressiona sempre e não se esquece.
E agora os seus heróis terão muita coisa para recordar.
Já é bom, pior seria se regressassem à vida deles apenas com o gosto amargo de não ter sequer tentado. Mas palpita-me que ainda lhes estão reservados alguns amargos de boca :)

Um beijinho amigo Majestade, rendida à beleza das imagens e das palavras da sua estória de amor entre o 7 pés e a bombeira.

Maria

opolidor disse...

Marie é uma grande bombeira e sabe bombar...

abraço

Anónimo disse...

Isto já é farinha a mais para tantos pés.

José Lopes disse...

A poligamia da Marie até que passa despercebida e a personagem torna-se simpática numa narrativa muito bem construida.
Cumps

Unknown disse...

Patamigo, ops, Majestadamigo

A Maria Centopeia está muito bem desarrincada. Eu, que escrevo por prazer, devoção e por umas c'roas (os €€€€€€€€ estão cada vez mais caros e... raros) gosto disto. E, tem assim, assim,de piada, muita não tem, mas tem alguma, estou a escrever um novo livro que é um hipotético romance policial.

Espero que vás deitar uma olhada lá pela Travessa; não pagas (ainda) IVA, nem é preciso o Cartão do Cidadão, muito menos o Número Fiscal do Contribuinte: é gente boa, ou seja, mais ou menos boa, quer-se dizer mais boa e menos boa. Dito tenho

Abç