Agora que a mãe se finara e lhe deixara liberdade para caminhar, Sete Pés poderia deixar a terra que não gostara de sua mãe, que não gostou de o ver nascer, que não lhe perdoou o facto de não ter pai. A falecida cuidara de Sete Pés e, neste particular, do Pé de Meia, facto que lhe permitiria sobreviver durante uns largos tempos sem preocupações financeiras se, como era de sua condição, gastasse massa apenas no essencial.
Os sete pés reuniram-se numa espécie de concílio e determinaram o Caminho. Porque teria de ser tomada uma direcção, porque deveria existir uma razão, embora pouco católicos, encontraram na seguinte premissa uma boa justificação:
“- Nunca será peregrino ou caminhante o cristão que não for a Santiago de Compostela a pé!”
E foi assim que a assembleia fez caminho de pé posto e determinou esse destino! Cada pé daria os seus passos, cada pé teria as suas motivações para caminhar, entre outras: Pé de Meia iria para gozar rendimentos, Pé de Atleta por desporto, Água Pé para tascas, Pé Chato para se chatear com os outros pés, Pé Ante Pé por temor ao Altíssimo, Pé de Vento para recolher a energia do caminho e Pé Descalço para fazer turismo e ouvir canções galegas.
Pé de Meia esclareceu os seus pares sobre a herança que a mãe puta juntara e encarregou-se de fazer um estudo económico; Pé de Atleta faria a preparação física; Pé de Vento trataria da lista de vestuário; Pé Descalço dos artigos de higiene; Pé Ante Pé dos artigos de farmácia; Pé Chato e Água Pé fariam não sei o quê.
Com os pés no estribo entenderam que não seria “caminhar” andar nas estradas portuguesas e tomaram o comboio até ao Minho.
Era fim de tarde quando poisaram pés em Valença. A mochila às costas denunciava o peregrino e, já na avenida que desce para o rio, um carro parou e o condutor perguntou se era preciso alguma coisa. Que não, mas mesmo assim o homem apresentou-se como padre José Maria, pároco dali, foi ao porta-bagagem e retirou uma oferta que constava de um guia do Caminho Português de Santiago e de um folheto com salmos e orações. Deu algumas indicações, alguns conselhos e a sua bênção e partiu com ar satisfeito de quem serviu.
Era fim de tarde quando poisaram pés em Valença. A mochila às costas denunciava o peregrino e, já na avenida que desce para o rio, um carro parou e o condutor perguntou se era preciso alguma coisa. Que não, mas mesmo assim o homem apresentou-se como padre José Maria, pároco dali, foi ao porta-bagagem e retirou uma oferta que constava de um guia do Caminho Português de Santiago e de um folheto com salmos e orações. Deu algumas indicações, alguns conselhos e a sua bênção e partiu com ar satisfeito de quem serviu.
Satisfeito também seguiu Sete Pés até à ponte de Gustavo Eiffel. Viu o edifício abandonado da antiga fronteira atenuar-lhe os receios de, pela primeira vez na vida, entrar num país estrangeiro.
- Um país estrangeiro, não é bem assim! - Interiorizara. A Galiza é quase Portugal, da língua e de outras coisas.
Começou a pisar o passeio pedonal da ponte já noite escura, rendendo cada passo a cada um dos pés e ouvindo, de cada um, um som diferente da trepidação dos ferros mal aparelhados. Os seus passos eram o cumprimento de todos os seus desejos, pensava:
- Que mais poderá desejar um homem na vida além de caminhar?!
12 comentários:
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Um personagem multifacetado a partir dos seus múltiplos pés com personalidades próprias. Um diálogo interior que se realiza devidamente assente no chão que se pisa. Boa caminhada.
Já cá o esPÉrava!
E deu uma boa passada. Até porque, já lá dizia o Machado, camiñante no hay camiño el camiño se hace al andar (de comboio, também)
E correspondeu inteiramente à exPÉctativa, que era PÉsada.
Venha o 7Pés4!
Um braço
Trilhando o caminho de Santiago, a pé, com muitos pés...
Cumps
Um filho da puta vai em peregrinação a Santiago... Boa escolha! Porque em Santiago há lugar para tudo: para o "temor ao Altíssimo", para as tascas e "para fazer turismo e ouvir canções galegas". Satisfação para todos os Pés! Venha o Sete Pés Quatro!
A pergunta que se impõe fazer: o padre José Maria teria feito a oferta, soubesse ele que Sete Pés era filho de quem era?
E "pé para que vos quero" ou será "pernas"
Abraço
O Pé Rapado seguiu a Pé para Santiago que fica já ali, para quem tem Pé Leve.
Abraço do Zé
Bom argumento com pés para andar e ir longe.Já agora não podiam ser dois episódios por semana?
Abraço um tanto ou quanto em suspense
Majestade,
Não sei qual dos pés do personagem acompanho - todos, se ele permitir e não reservar pés à minha companhia.
Certo é que acompanho e saboreio a sua história (estória).
Como é deliciosa esta sua narração.
Então e depois, que sucedeu?!...
Um beijinho amigo
Maria
E o que é a vida senão uma caminhada, às vezes árdua, outras nem tanto? Tanto escolho para arredar. Tanta rasteira a fintar. Às vezes para impormos a nossa vontade e defender os nossos direitos, temos de armar um pé-de-vento!
Ainda vou ver o 7Pés bem singrado na vida!
Abraço
Compadre Alentejano
Pata rei
assim se vai percebendo a brilhante imaginação que vai dizendo da vida...
abraço
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